Neste conteúdo iremos abordar:
- 1. Paciente crítico: fase aguda e fase crônica;
- 2. Hipermetabolismo e catabolismo no paciente crítico;
- 3. As alterações hormonais no paciente crítico;
- 4. As alterações imunológicas no paciente crítico;
- 5. Manejo nutricional.
Todo trauma ao organismo, independente da causa, gera um conjunto complexo de respostas imediatas com o objetivo de manter a homeostase e a vida.
Essas reações são desencadeadas por diversos componentes como: lesão e grau de comprometimento tecidual, perda de sangue, infecção, presença da dor e fatores como o medo e a ansiedade. A intensidade do trauma define a extensão e a magnitude dessas respostas, em associação a outros fatores do próprio tratamento, como a necessidade de jejum prolongado, por exemplo.¹
Com pequenas variações, cerca de 4% dos pacientes submetidos a intervenções cirúrgicas perdem a vida antes de deixar o hospital. Aproximadamente 15% apresentam morbidade pósoperatória grave e entre 5 e 15% são readmitidos dentro de 30 dias por complicações. Estima-se que o controle adequado das alterações metabólicas possa evitar até 50% destas mortes e complicações.¹
Paciente Crítico: Fase aguda e fase crônica
O Ministério da Saúde define como paciente crítico agudo, ou grave, como “aquele que se encontra em risco iminente de perder a vida ou função de órgão ou sistema, bem como aquele em frágil condição clínica decorrente de trauma ou outras condições relacionadas a processos que requeiram cuidado imediato”.²
Segundo a SOPATI (Sociedade Paulista de Terapia Intensiva), o paciente crítico torna-se crônico quando sobrevive à sua condição grave inicial, porém, sem atingir a estabilidade adequada, necessitando de suporte prolongado na UTI.
Hipermetabolismo e catabolismo no paciente crítico
Toda ferida causa o aumento da atividade metabólica e do trabalho celular, exigindo uma grande quantidade de energia para o processo de cicatrização, principalmente devido ao aumento de células inflamatórias e da síntese de colágeno pelos fibroblastos.
O paciente em estado crítico passa a ter um hipermetabolismo, ou aumento do metabolismo basal, acima da resposta metabólica normal, com aumento da demanda de energia e de nutrientes, de forma diferente da necessidade encontrada em um paciente saudável, conforme o exemplo a seguir:¹
As alterações hormonais do paciente crítico
O paciente crítico, principalmente após o trauma cirúrgico, apresenta algumas alterações hormonais importantes, entre as quais podemos destacar:¹
O controle dos níveis insulínicos é importante para promover o armazenamento da glicose, dos ácidos graxos e dos aminoácidos, finalizando a fase catabólica e iniciando a fase de recuperação, ou anabólica. 1
As alterações imunológicas do paciente crítico
Quando ocorre um trauma, cirúrgico ou acidental, ocorrem também alterações imunológicas importantes devido a complicações inflamatórias ou infecciosas. No local da lesão, ocorre a liberação de citocinas e ativação de cascatas humorais, visando a cicatrização da ferida pela estimulação da angiogênese e pela migração dos leucócitos e dos fibroblastos.
Em condições normais, existe um equilíbrio entre as citocinas pró-inflamatórias e anti-inflamatórias. Este equilíbrio, no entanto, é bastante frágil e, conforme a intensidade do trauma, essa liberação de citocinas pode causar uma reação imune descontrolada, gerando um processo inflamatório autodestrutivo, que eventualmente afeta órgãos que não estão diretamente envolvidos no trauma original.¹
Estas complicações aumentam os riscos de falência múltipla de órgãos e sepse, associados a 80% da incidência de mortalidade, além da possibilidade de ocorrência de necrose tecidual, choque, translocação bacteriana e depressão do sistema imunológico. ¹
Manejo Nutricional
Como foi citado, o paciente crítico apresenta tanto a degradação das proteínas, quanto a redução da síntese proteica, condição agravada pelas alterações hormonais e aumento das necessidades energéticas. Quando o paciente apresenta um trauma grave, a exemplo de queimaduras e sepse, esta degradação da proteína sofre um aumento ainda maior.¹
Detectar de forma mais precoce o risco e as alterações no estado nutricional do paciente crítico é fundamental para reduzir a morbimortalidade e amenizar as complicações operatórias relacionadas à desnutrição, alterando seu desfecho clínico.7
A Avaliação Nutricional acompanhada da Terapia Nutricional tem como objetivo identificar as necessidades do paciente e reverter a desnutrição, especialmente no que diz respeito ao aporte calórico e de proteínas, além de nutrientes importantes para a cicatrização e a função imune.
Whey Protein Apesar das evidências, ainda é bastante comum a dificuldade de se atingir a meta proteica em grande parte dos pacientes, sendo uma das causas, o foco dado à meta calórica em detrimento das necessidades de proteínas.9
A proteína do soro do leite apresenta-se como a melhor opção proteica para o paciente por apresentar melhor digestibilidade e conter todos os aminoácidos necessários com maior disponibilidade para a síntese proteica muscular e, especificamente, com aproximadamente 14% de leucina, a principal fonte de energia para a recuperação da musculatura.10 Além disso, esta fonte de proteína é rica em cisteína e metionina, importantes para a função imunológica e controle do estresse oxidativo.
Contém também a lactoferrina, que apresenta propriedades antibacterianas e antivirais, agindo no estímulo do sistema imunológico e na regulação do metabolismo do ferro.11
Além disso, os peptídeos bioativos gerados pela hidrólise do whey protein, estimulam a liberação de hormônios intestinais como a colecistocinina, polipeptídeo insulinotrópico dependente de glicose (GIP-1) e o peptídeo semelhante ao glucagon (GLP-1) que potencializam a secreção de insulina, essencial para o término da fase catabólica.12
Imunonutrição
A terapia nutricional denominada de imunonutrição, é considerada uma dieta imunomoduladora por conter, além do aporte proteico e calórico recomendado, uma quantidade de imunonutrientes específicos maior do que na dieta padrão. Estudos mostram que esta terapia reduz em até 51% o risco de infecção no período perioperatório.13 Estes nutrientes estão relacionados ao fortalecimento do sistema imunológico e à modulação inflamatória.14
Conclusão
O paciente em estado crítico apresenta alterações metabólicas, com aumento da demanda de energia, proteínas e de nutrientes específicos. Dessa forma, é possível, através de Terapia Nutricional, prevenir e reverter quadros de desnutrição, com destaque para a melhora do sistema imune e da cicatrização.
Referências bibliográficas
Referências Bibliográficas: 1. Medeiros A.C., Dantas Filho A.M. Resposta metabólica ao trauma. J Surg Cl Res –Vol. 8 (1) 2017:56-76. 2. Ministério da Saúde. Portaria nº 2.338, de 3 de outubro de 2011 3. Sociedade Paulista de Terapia Intensiva. O paciente crítico crônico. 4. Braga JM, Hunt A, Pope J, Molaison E. Implementation of dietitian recommendations for enteral nutrition results in improved outcomes. J Am Diet Assoc. 2006 Feb;106(2):281–4. 5. Badawi et al. Crit Care Med 2012; 40:3180-3188. 6. Campanha “Diga não à desnutrição”: 11 passos importantes para combater a desnutrição hospitalar. BRASPEN J 2018; 33 (1): 86-100. 7. Ferreira V.A. Evolução e desfecho nutricional em pacientes com período de internação prolongada. Universidade Federal de Ponta Grossa. 2018. 8. Organização Mundial da Saúde (OMS) 9. Singer P, Cohen JD. To Implement Guidelines: The (Bad) Example of Protein Administration in the ICU. JPEN J Parenter Enteral Nutr 2013; 37: 294. 10. Marik P.E. Feeding critically ill patients the right ’whey’: thinking outside of the box. A personal view. Ann Intensive Care. 2015;5(1):51. 11 . Rosa L., Cutone A., Lepanto M.S., Paesano R., Valenti P. Lactoferrin: A Natural Glycoprotein Involved in Iron and Inflammatory Homeostasis. Int J Mol Sci. 2017;18(9):1985. 12. Abrahão V. Nourishing the dysfunctional gut and whey protein. Curr Opin Clin Nutr Metab Care. 2012;15(5):480-484. 13. Drover JW, et al. Perioperative use of arginine-supplemented diets: a systematic review of the evidence. JAm Coll Surg. 2011 Mar;212(3):385-99, 399.e1. 14. Rosa L.P.S., Cruz D.J. Efeitos dos imunomoduladores na oncologia: revisão de evidências científicas. Rev. Saúde.Com 2016; 12(2): 561-565.
Cerca de 15% dos pacientes submetidos a cirurgias apresentam morbidade pós-operatória grave.
5 a 15% deles são readmitidos em 30 dias após a alta por complicações e, em média 4% deles perdem a vida antes de deixar o hospital.
O controle das alterações metabólicas pode evitar até 50% dessas mortes e complicações.
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