
Ingtrodução
Um grande desafio para treinadores e atletas é elaborar programas de treinamento com intuito de otimizar e alcançar a melhor performance. Objetivamente, um maratonista para alcançar o pódio necessita de treinamento e preparo antes da competição. No entanto, os programas de treinamento podem resultar em situações indesejadas, como performance reduzida, fadiga excessiva, ou até mesmo, lesão.1
Vamos orbitar com esta mesma visão acima um paciente dentro da unidade de terapia intensiva (UTI). O intensivista deve entender que o músculo representa cerca de 40% da composição corporal e é considerado o tecido fundamental para executar o movimento. Não devemos neste momento esquecer que o movimento pode ser para executar funções vitais incluindo: mastigação, deglutição e respiração.2 Dessa forma, o diafragma, músculo responsável pela respiração, se torna o elemento mais importante para o sucesso do desmame da ventilação mecânica. Pensando assim, a maneira de tratar o diafragma também deve ser pautada nos modelos de preparo dos músculos dos atletas de elite, já que vencer o desmame ou a desintubação é praticamente o mesmo esforço (guardado às proporções) que vencer uma prova de alto nível.
Nos últimos 10 anos, a mortalidade hospitalar por sepse foi reduzida pela metade, mas o número de pacientes que necessitam de reabilitação, após a alta, triplicou.3 Os sobreviventes de UTI podem adquirir sequelas tanto funcionais, como cognitivas e psicológicas conhecido como síndrome pós-UTI.4
Assim, novas intervenções metabólicas e de exercício são fundamentais na abordagem desta síndrome pós UTI. Estas intervenções deverão ser pró-ativas, pois nos é dada esta opção, antes que a sequela seja imposta pelo tempo, intensidade da resposta inflamatória, imobilismo, nutrição inadequada, dentre outros fatores de risco na UTI. De maneira pragmática, as estratégias deverão também se concentrar na nutrição no momento adequado,principalmente na oferta proteica, avaliação da massa magra e reabilitação motora. A meta nutricional bem como as medidas anabólicas/anticatabólicas, e a utilização de técnicas personalizadas da intervenção do exercício, como as utilizadas por atletas de elite, são necessárias para otimizar a preparação e recuperação do paciente na UTI.5
A resposta inflamatória é a mesma do trauma intenso e do exercício de alta intensidade?
A resposta metabólica deflagrada durante o exercício de alta intensidade é semelhante à reação metabólica ao trauma extenso e à sepse. 6 A figura 1, compara a dinâmica dos mediadores inflamatórios durante a sepse e o exercício. O comportamento da IL-6 é muito semelhante nos dois modelos comparados, entretanto o TNF é capaz de modular a resposta e diferenciar o comportamento.
Além disso o músculo esquelético pode se comunicar com outros órgãos por proteínas chamadas miocinas.7 Determinadas miocinas podem provocar uma resposta anti-inflamatória com cada contração muscular durante a reabilitação com exercício.

Faz sentido somente em atletas a oferta proteica ser elevada?
Estudos randomizados demostram que a quantidade de proteína prescrita como meta não é a mesma do que os pacientes realmente recebem durante a estadia na UTI, não sendo o suficiente para a sua necessidade. A média de proteína beira 0,8 g/Kg/dia no melhor cenário de intervenção dos estudos ditos randomizados. 8 Por um momento, se imaginarmos a trajetória da proteína no organismo, cerca de 10% desta proteína é utilizada para ressíntese muscular, por exemplo, um paciente que recebe 20g/dia, apenas 2g alcançaria o músculo (Figura 2).9
Em contrapartida, a ASPEN junto a SCCM recomendam uma quantidade de proteína de 1,2na 2,0 g/kg/dia ou até valor superior em trauma ou queimado. 10 Estudos observacionais, com efeitos associativos sugerem que a oferta proteica, quando comparada com oferta calórica, está associada com melhores desfechos clínicos. 11 Ferrie et al. randomizaram pacientes de UTI em duas estratégias de proteína. O grupo com maior oferta proteica obteve melhora significativa na massa muscular e, tendência para a força maior do que o outro grupo.12
A resposta para a pergunta do subtítulo, é que não faz sentido elaborar estratégias somente para atletas já que o paciente grave também necessita de uma adequada oferta proteica.
O kit do atleta funciona na UTI?
No mundo do esporte, a associação de exercícios de resistência e suplementação de proteína é amplamente difundida, pois aumenta a massa muscular. No entanto, esse 'kit' não é um conceito frequentemente aplicado ao paciente crítico.
Em adultos saudáveis, manter o aminoácido elevado no período pós-exercício aumenta a síntese de proteína muscular. Quando ambas as estratégias são analisadas separadamente, o efeito ergogênico não é relevante.
Desde 1997, Biolo já havia demonstrado que a intervenção combinada da oferta proteica com atividade física aumentava a síntese muscular muito mais ao comparar com a oferta de proteína isoladamente.13 Alguns estudos, demonstram que a maior oferta de proteína está associada à melhora do desmame da ventilação mecânica.
Outros estudos em UTI associam a oferta proteica elevada à melhores desfechos funcionais. Fato que a maioria dos estudos é observacional e poucos são randomizados, porém, independente do desenho dos estudos, a elevada oferta proteica é sempre protagonista.14

Conclusão
Respondendo à pergunta se o paciente crítico pode ser considerado um atleta: sim, pode. Basicamente a diferença entre o atleta e o paciente crítico é: o atleta busca melhorar o desempenho e o paciente crítico busca melhorar o desfecho. Podemos postular que para manter a massa muscular adequada, uma estratégia assertiva e combinada de proteína, exercício possui o maior impacto na recuperação dos sobreviventes da UTI.

Nota importante:
O tratamento do paciente envolve tanto o acompanhamento nutricional quanto um conjunto de procedimentos terapêuticos, que fazem parte da avaliação de uma equipe multidisciplinar.
Referências bibliográficas
1. Wischmeyer PE, and San-Millan, I. Winning the war against ICU-acquired weakness: new innovations in nutrition and exercise physiology. Critical Care 2015, 19:S6.
2. Role of oral nutritional supplements enriched with _-hydroxy-_-methylbutyrate in maintaining muscle function and improving clinical outcomes in various clinical settings. Sanz-Paris A, Camprubi-robles M, Lopez-Pedrosa JM, Pereira SL, Rueda R, Ballesteros-Pomar MD, et al. J Nutr Health Aging. 2018;22(6):664-675.
3. Kaukonen KM, Bailey M, Suzuki S, Pilcher D, Bellomo R: Mortality related to severe sepsis and septic shock among critically ill patients in Australia and New Zealand, 2000-2012. JAMA 2014, 311:1308-16.
4. Wischmeyer et al. Muscle mass and physical recovery in ICU: innovations for targeting of nutrition and exercise. Curr Opin Crit Care 2017, 23:269–278
5. Toledo DO, Giorelli G, Castro MG. The critically ill patient: an athlete who never rest. World Journal of Advance Healthcare Research. 2019; 3(2): 69-72.
6. Pedersen, B. K. & Febbraio, M. A. Muscle as an endocrine organ: focus on muscle-derived Interleukin-6. Physiol. Rev.88, 1379–1406 (2008)
7. Pedersen, B. K. Muscle as a secretory organ. Compr. Physiol. 2013; 3: 1337–1362
8. Toledo DO, Costa RG, Castro MG. Meta proteica versus disfunção renal na Unidade de Terapia Intensiva. Braspen Journal 31 (4) 2016.
9. Stokes T, Hector AJ, Morton RW, McGlory C, Phillips SM. Recent Perspectives Regarding the Role of DietaryProtein for the Promotion of Muscle Hypertrophy with Resistance Exercise Training. Nutrients 2018, 10, 180.
10. McClave S a, Martindale RG, Vanek VW, et al. Guidelines for the Provision and Assessment of Nutrition Support Therapy in the Adult Critically Ill Patient: Society of Critical Care Medicine (SCCM) and American Society for Parenteral and Enteral Nutrition (A.S.P.E.N.). JPEN J Parenter Enteral Nutr. 2009;33(3):277-316.
11. Heyland DK, Cahill N, Day AG. Optimal amount of calories for critically ill patients: depends on how you slice the cake! Crit Care Med. 2011;39(12):2619-2626
12. Ferrie S, Allman-Farinelli M, Daley M, Smith K. Protein Requirements in the Critically Ill: A Randomized Controlled Trial Using Parenteral Nutrition. JPEN J Parenter Enteral Nutr. 2016 Aug;40(6):795-805.
13. Biolo G, Tipton KD, Klein S, Wolfe RR. An abundant supply of amino acids enhances the metabolic effect of exercise on muscle protein. Am J Physiol. 1997;273(1 Pt 1):E122-9
14. Heyland DK, Stapleton RD, Mourtzakis M, Hough CL, Morris P, Deutz NE, et al. Combining nutrition and exercise to optimize survival and recovery from critical illness: Conceptual and methodological issues. Clin Nutr. 2016.
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Um grande desafio para treinadores e atletas é elaborar programas de treinamento com intuito de otimizar e alcançar a melhor performance. Objetivamente, um maratonista para alcançar o pódio necessita de treinamento e preparo antes da competição. No entanto, os programas de treinamento podem resultar em situações indesejadas, como performance reduzida, fadiga excessiva, ou até mesmo, lesão.
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