Alguns dos maiores desafios nutricionais se dão em pacientes pediátricos críticos, oncológicos ou com doenças raras, pelo fato de apresentarem variáveis específicas que, algumas vezes, requerem que o próprio paciente participe de protocolos de pesquisa para chegar a um resultado mais assertivo. Além disso, é importante considerar que quanto melhor o estado nutricional do paciente, mais benéfico será o desfecho do tratamento da enfermidade como um todo.
Dentre os casos citados acima, os pacientes pediátricos com câncer estão mais suscetíveis à desnutrição, devido ao possível hipermetabolismo causado pela doença e pela demanda energética natural da idade. Porém, no decorrer da doença ou como efeito colateral do tratamento, os pacientes podem apresentar baixa ingesta alimentar e absorção prejudicada dos nutrientes.
Por tais motivos, é importante que haja avaliação nutricional completa para que o melhor protocolo nutricional seja delegado ao caso específico de cada paciente.
Considerando a alta prevalência da desnutrição de pacientes pediátricos críticos e sua gravidade diretamente ligada ao período de internação na UTI, o suporte nutricional adequado é fundamental para minimizar ou reverter os efeitos do catabolismo ainda na fase aguda da internação.
Além disso, há mais de 13 milhões de brasileiros com um dos tipos de doenças raras, sendo que a maioria destes pacientes apresenta manifestações da enfermidade já na infância e demora de 2 a 4 anos para ser diagnosticado. Dessa forma, o tratamento depende de uma equipe multidisciplinar em centro especializado, é oneroso e altamente dependente das especificidades de cada criança, uma vez que há casos em que a nutrição é a base para o tratamento, e outros em que ela serve de apoio para o recurso terapêutico.1
1. Paciente pediátrico oncológico
A prevalência de desnutrição em crianças com diagnóstico de câncer é de 6% a 50%. Os principais fatores que contribuem com esse diagnóstico, são: tipo, localização, grau de malignidade e presença de metástase.2
Consequências da desnutrição em pacientes oncológicos:2
- Maior tempo e número de internações;
- Mais infecções;
- Menor tolerância ao tratamento;
- Menor sobrevida;
- Menor qualidade de vida.
No paciente pediátrico com câncer, tanto pré-tratamento, como durante o tratamento (seja ele radio/quimioterapia, cirurgia, internação, UTI, transplante de células-tronco hematopoiéticas ou paliativo), os principais parâmetros nutricionais a serem analisados são o estado nutricional e a ingestão alimentar.
Intervenção Nutricional
O objetivo da intervenção nutricional é promover o crescimento e desenvolvimento da criança, melhorar a resposta imunológica e aumentar a tolerância ao tratamento. Por isso, a avaliação de risco nutricional deve ser realizada.
A terapia nutricional é indicada, quando houver:3
- Perda de peso superior a 5%, relacionada ao peso anterior ao diagnóstico;
- Redução de reservas adiposas, com medida da prega cutânea tricipital < percentil 5;
- Redução de dois percentis no peso ou na estatura;
- Desnutrição severa – caquexia relaciona ao câncer;
- Ingestão alimentar < 70% das necessidades nutricionais totais por 5 dias, independente do comprometimento antropométrico;
- Toxicidade dos tratamentos.
A terapia nutricional também é indicada em casos de:4
- Incapacidade de mamar ou engolir:
Ex: doenças neurológicas e degenerativas, prejuízo severo no desenvolvimento mental, trauma, crianças críticas em ventilação mecânica.
- Anorexia associada à doença crônica:
Ex: fibrose cística, câncer, doença inflamatória intestinal, doença hepática, doença renal crônica, cardiopatia congênita, erros inatos do metabolismo.
- Aumento das necessidades nutricionais:
Ex: fístula traqueosofágica, atrésia de esôfago, má formação orofacial.
- Repercussão de Doenças Primárias:
Ex: Doença de Crohn, doença do refluxo gastroesofágico grave, síndrome do intestino curto, desordens no metabolismo do glicogênio e dos ácidos graxos de cadeia longa.
Terapia Nutricional Enteral via oral
Deve ser realizada com suplementos orais, quando a ingestão alimentar for menor que 75% das necessidades por 3 a 5 dias consecutivos, sem expectativa de melhora.
Terapia Nutricional Enteral via sonda
Deve ser aplicada na impossibilidade de via oral ou quando a ingestão alimentar for menor que 60% das necessidades por 3 a 5 dias consecutivos, sem expectativa de melhora.
Terapia Nutricional Parenteral
Deve ser aplicada em caso de impossibilidade total ou parcial de uso do trato gastrintestinal ou quando a nutrição enteral não atingir a meta após 5 dias.5
A Terapia Nutricional ainda é negligenciada, apesar de estudos demonstrarem que a desnutrição e o sobrepeso/obesidade são associados à maior morbidade e mortalidade. Por isso, é importante lembrar que, quanto mais adequado for o estado nutricional do paciente durante o tratamento, melhores são os desfechos.
2. Paciente pediátrico crítico
A população sob cuidados intensivos pediátricos é heterogênea e, por isso, necessita de abordagem diferenciada para individualizar o suporte nutricional com o objetivo de melhorar os resultados clínicos.
A desnutrição na UTI possui prevalência de 24% a 70% em pacientes pediátricos. O que configura maior tempo de internação, permanência em ventilação mecânica e risco de infecções.6
Necessidade de suporte ao paciente pediátrico crítico
O paciente pediátrico crítico possui alterações do gasto energético, que envolvem alterações do metabolismo dos macronutrientes, aumento da lipólise e proteólise, hiper ou hipoglicemia, dislipidemia e perda da massa e desnutrição.7
Necessidades nutricionais
Considerados como um público vulnerável, crianças e adolescentes apresentam necessidades nutricionais aumentadas, porém difíceis de serem alcançadas, que podem ser visualizados pela calorimetria indireta. Esses pacientes apresentam alto risco nutricional, além da depleção muscular. Mas, já se sabe que crianças que atingem suas metas calóricas precocemente apresentam melhores resultados.
Objetivo da terapia nutricional enteral: 8
- Garantir a integridade da mucosa;
- Reduzir o risco de translocação;
- Melhorar o desfecho clínico;
- Reduzir a mortalidade.
Terapia Nutricional no Paciente Crítico 8
A Nutrição Enteral (NE) é a primeira via de escolha de terapia nutricional do paciente crítico. Ela deve ser iniciada dentro de 24 a 48 horas de admissão na UTI. O Guideline Aspen de 2017 sugere a Nutrição Parental (NP) para crianças que não receberam nenhuma NE ou em desnutridos graves e/ou com grande risco nutricional, bem como NP parcial, complementando a NE, caso essa não consiga progredir para o atingimento das metas.
3. Paciente pediátrico com doenças raras10
Doenças raras são um importante problema de saúde no mundo. Estima-se que há de 6.000 a 8.000 tipos, sendo 80% de origem genética e as demais possuem causas ambientais, infecciosas e imunológicas. A maior parte das manifestações ocorre na infância (75% afetam crianças).
Elas se caracterizam pela baixa prevalência, podendo ser crônicas, progressivas e incapacitantes, com ampla diversidade de sintomas e a maioria sem cura efetiva. O tratamento é oneroso e necessita da inclusão de pacientes em protocolos de pesquisa.
O maior desafio é o diagnóstico precoce. Pacientes pediátricos recebem 2 a 3 diagnósticos preliminares e são submetidos a 6 ou 7 exames antes da confirmação. O tratamento envolve equipe multidisciplinar em centros especializados.
Ex: Distrofias musculares, neurofibromatose, angioedema hereditário, erros inatos do metabolismo, imunodeficiências primárias, fibrose cística, entre outras.
Intervenção nutricional:
- Doenças com terapia nutricional específica (Ex: erros inatos do metabolismo);
- Doença com acometimento neurológico: uso de via alternativa de alimentação (enteral ou parenteral);
- Acompanhamento/correção dos desvios nutricionais.
Referências utilizadas na construção da aula pelas profissionais:
1. Bauer J, Jürgens H, Frühwald M. Important Aspects of Nutrition in Children with Cancer. Advances in Nutrition. 2011;2(2):67-77.
2. Ladas EJ, et al. A multidisciplinary review of nutrition considerations in the pediatric oncology population: a perspective from children's oncology group. Nutr Clin Pract. 2005;20(4):377- -393.
3. Consenso nacional de nutrição oncológica / Instituto Nacional de Câncer José Alencar Gomes da Silva, Coordenação Geral de Gestão Assistencial, Hospital do Câncer I, Serviço de Nutrição e Dietética; organização Nivaldo Barroso de Pinho. 2. ed. rev. ampl. atual. – Rio de Janeiro: INCA, 2015. 182p.
4. Johnson. Enteral Nutrition. In: Shaw, Lawson. Clinical Pediatric Dietetisc. Blackwell Publishing, 2007.
5. Consenso nacional de nutrição oncológica: paciente pediátrico oncológico / Instituto Nacional de Câncer José Alencar Gomes da Silva. – Rio de Janeiro: Inca, 2014. 88p.
6. Joffe A, et al. Nutritional support for critically ill children. Cochrane Database Syst Rev. 2016;(5):CD005144.
7. Skillman HE, Wischmeyer PE. Nutrition therapy in critically ill infants and children. JPEN. 2008;32(5):520-534.
8. Mehta NM, et al. Challenges to optimal enteral nutrition in a multidisciplinary pediatric intensive care unit. JPEN. 2010;34(1):38- -45.
9. Panchal AK, et al. Safety of Enteral Feedings in Critically Ill Children Receiving Vasoactive Agents. JPEN J Parenter Enteral Nutr. 2016;40(2):236-241.
10. Ribeiro A. Triagem Neonatal E Doenças Raras. 1ª ed. Revinter; 2019:176.
Fonte: Transcrição da aula disponibilizada no site Avante pela Dra. Camila Lemiechek Orellana Micelli e Nutricionista Mariana Murra.
Para assistir o vídeo aula na íntegra, acesse o site: https://www.avantenestle.com.br/conteudos-cientificos/pediatria/desafios-nutricionais-no-paciente-pediatrico-oncologia-critico-e-Intervenção nutricional
Alguns dos maiores desafios nutricionais se dão em pacientes pediátricos críticos, oncológicos ou com doenças raras, pelo fato de apresentarem variáveis específicas que, algumas vezes, requerem que o próprio paciente participe de protocolos de pesquisa para chegar a um resultado mais assertivo.
Confira mais nesta transcrição da aula ministrada em Avante Hospitalar e os principais pontos abordados.
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